quarta-feira, 21 de julho de 2010

Ainda Sobre a Década Batista de Combate ao Racismo

Como destaquei no post anterior, o Baptist Summit Against Racism, promovido pela Aliança Batista Mundial, em 1999, na cidade de Atlanta, resultou no Pacto de Atlanta, um documento através do qual os batistas condenaram veementemente o racismo como pecado e se comprometeram a combatê-lo em todas as suas formas. Juntamente com esse documento, foi lançada entre os batistas de todo o mundo a campanha de uma década de combate ao racismo, de 2000 a 2010. Não tenho como, pelo menos nesse instante, fazer uma investigação profunda sobre tudo o que se passou nesse período. Vale dizer que o novo livro que será lançado agora no final de julho, no Havaí, resgata algumas manifestações desta ênfase na vida da Aliança Batista Mundial, inclusive as que se deram nos últimos dez anos. O que pretendo aqui é simplesmente levantar algumas questões que podem estimular futuras reflexões e pesquisas.



Podemos considerar o Baptist Summit Against Racism, em 1999, e a campanha de combate ao racismo que resultou desse encontro, eventos realizados à sombra ou sob a influência historica das igrejas afro-americanas e particularmente do legado ético-social de Martin Luther King, Jr. Grande parte das reuniões se deu na Igreja Batista Ebenézer, igreja onde Dr. King foi criado, onde ele foi ordenado ao ministério e onde congregou no auge do movimento pelos direitos civis do qual foi um dos principais lideres. Momentos especiais do encontro aconteceram na Capela Internacional do Morehouse College, tradicional centro de formação afro-americano, onde ele também estudou. Alguns dos preletores desse evento foram companheiros de luta do Dr. King, e uma das participações mais esperadas foi a fala de sua viúva, D. Coretta Scott King, que também foi homenageada como diretora honorária do encontro. Martin Luther King Jr. foi citado em inúmeras falas. Seu espírito, suas palavras e as lembranças de suas ações permearam todo o encontro. Ele foi citado textualmente até mesmo no próprio Pacto de Atlanta, documento que resultou desse evento. Todos esses fatos confirmariam o que James E. Tull, no seu livro Shapers of Baptist Thought (originalmente publicado em 1972), afirmou ao colocar Dr. King entre os principais formadores do pensamento batista, classificando-o como um mártir do movimento afro-americano pelos direitos civis. Sua influência estaria presente na aplicação moral da força transformadora do evangelho a estruturas pecaminosas, perpetradoras da injustiça social e racial. O fato de que ele nasceu e foi criado numa família batista, foi ordenado ministro batista e permaneceu como tal até o dia de sua morte, mostra ainda que ser batista era parte significativa de sua identidade, a despeito de sua eminente ecumenicidade.


A proposta de uma década de combate ao racismo foi aprovada pelo Conselho Geral da Aliança Batista Mundial, reunido em Desdren, Alemanha, naquele mesmo ano. Algumas uniões ou convenções batistas, como por exemplo a União Batista da Grã-Bretanha, adotaram o Pacto de Atlanta e a ênfase no combate ao racismo e à discriminação  étnica, em geral, em seus programas.


A despeito de tudo isso, por que esse evento de tanto significado e seus desdobramentos foram tão pouco divulgados entre os batistas em algumas partes do mundo? Por que repercutiu tão pouco? Por exemplo, em meados de 2010, quando, às vésperas do XX Congresso Batista Mundial, estamos encerrando uma década batista de combate ao racismo, quantos batistas no Brasil, ou mesmo na América Latina, ao menos ouviram falar dela? Quantos artigos sobre a questão do racismo foram publicados nos nossos órgãos de imprensa? Quantas lições da Escola Bíblica Dominical discutiram o tema, ou usaram os estudos bíblicos sobre o mesmo gerados em Atlanta? Quantos sermões sobre justiça social e racial foram pregados dos púlpitos batistas latino-americanos na última década? Quantas campanhas foram feitas pelas diversas convenções e uniões batistas no mundo reproduzindo essa preocupação abraçada pela Aliança Batista Mundial? De que forma essa campanha, que, entre outras coisas, visava expressamente "desafiar as convenções e uniões batistas em todo mundo a confrontar ativamente as questões de racismo e ódio étnico em suas regiões", foi refletida na prática de nossas estruturas administrativas e educacionais? Se nada disso aconteceu, ou se tudo se deu de forma muito tímida, quais seriam as causas disso? O próprio espírito e legado de Martin Luther King Jr., ao qual fiz menção acima, não foi tão bem aceito assim entre alguns grupos batistas.  A que ponto seria Martin Luther King Jr. realmente uma importante influência na formação do pensamento batista contemporâneo?

No caso brasileiro, onde, assim como na maioria dos campos missionários do hemisfério sul, a maior força evangelizadora veio exatamente dos batistas do sul dos EUA, não é de se estranhar que até pouco tempo a informação de que Martin Luther King Jr. era um pastor batista era desconhecida da grande maioria dos batistas brasileiros e que seu pensamento teológico e moral, ou até mesmo a importante história do movimento que liderou, não entrassem nos currículos dos cursos de ética, teologia e história nos nossos seminários. Nesse evento histórico, em 1999, havia quatro batistas brasileiros presentes: eu, porque estudava na época numa faculdade teológica batista em Atlanta; um outro pastor batista brasileiro que morava na região; e apenas dois pastores vindo do Brasil. O presidente da Aliança Batista Mundial na época era brasileiro.

Por que demorou dez anos para esse pacto batista de denuncia e enfrentamento do racismo ser traduzido e publicado em português, e por iniciativa de uma revista teológica não denominacional? O que perdemos por termos ignorado todos esses desenvolvimentos nos ultimos dez anos?

Mesmo com esse atraso, a pergunta principal deve focar no presente e no futuro: Que impacto a leitura do Pacto de Atlanta, agora disponível em nossa língua, poderá causar sobre pastores/as e igrejas batistas no Brasil? De que forma será recebido? Certamente, muita coisa mudou na sociedade brasileira, no meio evangélico e nas igrejas batistas nacionais nos últimos dez anos. Espero viver uma outra década para ver o que virá adiante, e como essa bela iniciativa da Revista Novos Diálogos impactará a vida de evangélicos batistas e não batistas no Brasil.

2 comentários:

  1. Raimundo , por aqui , você sabe , a moda é A MARCHA PARA JESUS, com a presença de MONIQUE EVANS , GRETCHEN ,algo surreal......sei não
    Quem sabe um dia faremos a marcha CONTRA O RACISMO

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